Páginas

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

A Foraclusão do Sujeito


Cirurgia para os males emocionais
Benedict Carey

THE NEW YORK TIMES

Leonard, um escritor que vive nos arredores de Chicago, se recusava a entrar no chuveiro, até que se tornou completamente incapaz de tomar banho ou escovar os dentes.Ross, um adolescente que cresceu em um subúrbio de Nova York, tinha tanto pavor de bactérias que regularmente passava sete horas seguidas debaixo do chuveiro. Ambos foram diagnosticados com transtorno obsessivo-compulsivo grave, ou TOC, e durante anos não conseguiam sair de casa.Mas eventualmente eles saíram, e viajaram em grande desespero para um hospital em Rhode Island, para uma cirurgia cerebral experimental na qual quatro buracos profundos do tamanho de uma ervilha foram queimados em seus cérebros.Ross e Leonard foram colocados em uma espécie de máquina de ressonância magnética que emite feixes de radiação no crânio. Estes feixes atravessam o cérebro, sem causar danos, exceto nos pontos onde os feixes convergem. Nestes pontos, a radiação queima pedaços microscópicos de tecido cerebral em circuitos que costumam apresentar uma atividade excessiva em pessoas com TOC grave.Hoje, dois anos após a cirurgia, Ross está com 21 anos e cursando uma faculdade.– A operação salvou minha vida – disse ele.O mesmo não pode ser dito sobre Leonard, 67 anos, que se submeteu à cirurgia em 1995.– Não houve nenhuma mudança – lamentou. – Eu ainda não saio de casa.Os dois homens pediram que seus sobrenomes não fossem usados para proteger sua privacidade.Evolução A grande promessa da neurocirurgia no final do século passado era de que novas técnicas seriam capazes de revolucionar o tratamento para problemas psiquiátricos. Mas sua primeira aplicação prática não é novidade alguma. Trata-se de uma versão sofisticada e precisa de uma abordagem antiga e polêmica: a chamada psicocirurgia, em que médicos operam diretamente no crânio.Na última década, mais de 500 pessoas se submeteram à cirurgias cerebrais para problemas como depressão, ansiedade e até mesmo obesidade, na maioria das vezes como voluntários em estudos clínicos.Os resultados foram tão animadores que este ano, pela primeira vez desde que a lobotomia frontal caiu em descrédito em 1950, a Food and Drug Administration (FDA), agência norte-americana reguladora de equipamentos médicos, aprovou uma das novas técnicas cirúrgicas para casos graves de TOC.Embora não haja mais do que algumas milhares de pessoas que são prejudicadas o suficiente por problemas psiquiátricos para atenderem aos critérios rigorosos para este tipo de cirurgia, milhões de pessoas poderão procurar tais operações assim que as novas técnicas tornarem-se menos experimentais.Essa esperança, no entanto, vem acompanhada de enormes riscos e incertezas. Alguns psiquiatras e especialistas em ética médica afirmam que médicos ainda não sabem muito sobre os circuitos que estão adulterando, e os resultados são imprevisíveis: algumas pessoas melhoram, outras não sentem quase nada, enquanto poucos azarentos chegam até a piorar. Nos Estados Unidos, pelo menos uma paciente ficou incapaz de cuidar de si mesma após uma cirurgia que deu errado.Além disso, a demanda pelas operações é tão grande que poderia tentar cirurgiões menos experientes a oferecerem os procedimentos experimentais sem a supervisão e o apoio de centros de pesquisa.– As pessoas têm essa idéia de que o próprio progresso justifica as operações, e que se algo é promissor, então como podemos não usá-lo para aliviar o sofrimento? – explica Paul Wolpe, um especialista em ética médica da Universidade Emory, na Georgia.Poucos anos atrás, médicos consideravam a lobotomia frontal um grande avanço, lembra Wolpe, apenas para descobrir que a operação deixou milhares de pacientes com danos cerebrais irreversíveis.Muitas idéias promissoras na medicina encalham, acrescentou, “e é por isso que temos de avançar muito cautelosamente”.
Segunda-feira, 30 de Novembro de 2009

Nenhum comentário: